quarta-feira, 7 de junho de 2023

A ACERTADA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA

 

A ACERTADA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA

 

 

 

O Governo Lula, mais especificamente o próprio presidente Lula, acertadamente construiu, em tempo ágil, uma cúpula sul americana da maior importância.

A cimeira reuniu os chefes de estado de todos os países sul-americanos num momento singular da geopolítica internacional.

Com esse evento, Lula põe o subcontinente na crista da onda, dá um F5 na América do Sul, observando sagazmente o movimento em curso no mundo.

Que movimento é esse? A reorganização geopolítica do mundo rumo a formação de blocos regionais fortes.

Apenas para ficar no obvio: na Ásia, temos a ANSEAN, que reúne as nações do Sudeste da Ásia, UA União Africana, a SCO Organização para a cooperação de Xangai, a UEE União Econômica Eurasiática, a EU União Europeia etc.

No âmbito da América do Sul só tínhamos o Mercosul depois veio Unasul, mais antiga a Comunidade Andina, em 1998 é formada a ACTO Organização do Tratado de Cooperação Amazônica. As inúmeras dificuldades dos países sul americanos bem como a diversidade, a intervenção constante do imperialismo dificultou o funcionamento dessas iniciativas em vários níveis, inclusive com a infame dívida eterna a que muitos no subcontinente estão submetidos.

Dai a importância da iniciativa de Lula. Ela se coloca num momento de crise e tensões no centro do sistema. O grande Hegemon encontra-se atolado na Ucrânia, um atoleiro auto infligido, com volumes absurdos de recursos, a pauperização da Europa e a derrota cada dia mais evidente da OTAN frente ao exército russo.

De outro lado temos a emergência de novos centros de poder, notadamente o acentuado pêndulo do poder econômico em direção a Ásia com a China ultrapassando os EUA em várias áreas e a EURASIA, com a liderança da Rússia.

 

As possibilidades abertas à América do Sul

 

Esse cenário cria uma oportunidade única para nós, sul americanos, de avançarmos na construção de uma sociedade melhor.

O subcontinente americano é rico em recursos naturais petróleo, áreas agrícolas, um setor agroexportador bastante avançado. Temos algumas das maiores reservas de lítio conhecidas do planeta. Além do ouro, cobre e prata explorados desde os tempos coloniais temos grandes reservas de ferro, diamante, chumbo, zinco, manganês, estanho bauxita e gás natural. Recentemente o México propôs aos países da região a   criação de uma espécie de OPEP do lítio.

Contamos ainda com cerca de 12% da superfície terrestre e 6% da população global. Somos banhados pelo Mar do Caribe e pelos oceanos Pacifico e Atlântico               

 

O subcontinente tem assim objetivamente condições de formar um bloco econômico forte o suficiente para se tornar um player mundial. A iniciativa do presidente Lula baseia-se muito nessa crença. Numa percepção de que, sim temos enormes problemas, mas ao mesmo tempo temos enormes possibilidades.

 Nossos eternos dilemas

Apesar das condições objetivas, o subcontinente encontra-se enterrado sob a esfera de influência dos EUA. Resulta disso burguesias clientes do capital norte americano que, com aprofundamento do domínio do capital rentista nos EUA, se submetem a essa lógica depreciando sua industrialização.

Os EUA atuaram ativamente na região financiando, influenciando, fomentando partidos políticos que, uma vez no poder, implementam uma lógica de desmonte do Estado de privatizações de grandes empresas chaves dos serviços básicos à população.

O efeito dessa lógica deleitaria na região são o aumento da pobreza, as dificuldades de acesso a serviços básicos. As empresas públicas objeto de privatizações são adquiridas por fundos de investimento, bancos e outras empresas multinacionais a preços depreciados

Resulta daí que nossa direita e ultradireita é, essencialmente e contraditoriamente entreguista. Abusam dos símbolos nacionais, juram amores a pátria, mas entrega o patrimônio nacional a preço de banana e em desfavor das suas populações.  

No entanto, em momentos como a atual onde emergem governo progressistas nos principais países da região renascem as esperanças de que uma articulação regional possa atuar na superação dos enormes problemas das populações mais pobres, articular políticas econômicas de incentivo ao desenvolvimento de uma

economia regional voltada para o desenvolvimento e incremento de uma produção industrial, para a autossuficiência alimentar, uma indústria naval própria e, em perspectiva, segurança militar na região.

 

Essa é a dimensão da iniciativa do governo Lula e sua visão das possiblidades abertas ao subcontinente sul americano.          

 

 

Isaias Jose de Almeida Neto

Pós-graduado em História do Brasil

Professor Aposentado redes públicas e privada de ensino da Educação básica e Superior              

quarta-feira, 24 de maio de 2023

O LEGADO DE MORTE DO OCIDENTE

 

Vinte anos após os ataques terroristas de 11 de setembro, surgiram dados estatísticos convincentes sugerindo que o verdadeiro número de mortos da 'Guerra ao Terror' pode chegar a seis milhões de pessoas - e que esse número colossal provavelmente é conservador.

Os EUA lideraram os ataques no Iraque, Afeganistão, Síria, Iêmen e Paquistão matando pelo menos 4,5 de pessoas e provocando um deslocamento de refugiados entre 38 – 60 milhões.

Hoje 7,6 milhões de crianças passam fome nesses países. 

Veja o estudo da Brown University Leia aqui

BRICS - Pegue sua senha

 

Depois de ver seu PIB ultrapassar o PIB do G,7 os BRICS não param de receber solicitações de novos integrantes. Além da força econômica, os BRICS têm outro atrativo que tem seduzidos os outros países: cooperação, desenvolvimento, comércio, não interferência na vida alheia. Resultado tai a lista de novos pretendentes. E a distribuição de senhas ainda não terminou.

 

 A


rgel, Argentina, Afeganistão, Bangladeche,

Bahrein, Bielorrússia, Venezuela, Egito,

Zimbábue, Indonésia, Irã, Cazaquistão,

México, Nigéria, Nicarágua, Emirados Árabes Unidos,

Paquistão, Arábia Saudita, Senegal, Síria,

Sudão, Tailândia, Tunísia, Peru,

Uruguai

segunda-feira, 22 de maio de 2023

O caso Vinicius Junior, muito além do futebol

 

O caso Vinicius Junior, muito além do futebol

 

“Nós somos o jardim, o resto do mundo é a selva e o jardim precisa ser protegido da selva”

Joseph Borrell

 

Há tempos a Europa tem regredido no se que refere a muitas coisas, mais especialmente no preconceito, racismo, xenofobia, eslavofobia e russofobia.  Parece que a indigência intelectual de suas lideranças se expressa no empobrecimento humanitário de grande parte de sua população e o caso do racismo com o jogador de futebol Vinicius Junior, do Real Madri, no último fim de semana demonstra, mais uma vez esse fato.

Quando a primeira notícia da construção de uma união europeia chegou até mim confesso que fui tomado por um idealismo romântico. Fiquei entusiasmado porque a Europa poderia superar questões seculares como um nacionalismo exacerbado intolerância religiosa etc, A Europa assim poderia oferecer a humanidade um outro projeto de sociedade, mas cooperativa, mais tolerante, mais solidaria. Isso foi no século passado.

Nas últimas décadas, com a ascensão da extrema direita e governos neocons, ainda que travestidos de social democratas, verdes, liberais, trouxeram a tona, uma onda de intolerância, racismo, xenofobia e todos os sentimento mais baixos do ser humano.    

O desprezo por imigrantes, negros, eslavos e tudo que não for branco, ocidental, anglo-saxão, teutônico, católico ou evangélico, é um sentimento que perpassa grandes parcelas da população da sociedade ocidental.

Aqui, no Brasil, conhecemos o racismo como algo direcionado aos negros, mas na Europa o racismo vai além e engloba todo o leste europeu, tratado como inferior. Hitler apenas vocalizou e agiu sobre esse sentimento que está presente em muita gente por lá.

O projeto de Hitler para o leste Europa era simplesmente transformar a população daquela parte da Europa em mão de obra compulsória para a indústria do III Reich.

As práticas do governo espanhol como o muro de Ceuta, a perseguição aos ciganos por parte da França e da Itália, especialmente aos romenos, o antissemitismo, sem falar nos indivíduos de origem africana discriminados em toda a região, mostram que a Europa está regredindo não só economicamente, mas em termos civilizacionais.     

Há, no entanto, muita gente boa por lá, resta esperar que elas tenham forças para reverter essa tendência nefasta.   

quinta-feira, 18 de maio de 2023

CÚPULA CHINA - ÁSIA CENTRAL

       

    DIPLOMACIA CHINA  

    A cúpula China-Ásia Central testemunhará a assinatura de uma série de documentos em comércio, investimento, conectividade e outros campos.

    Encontro histórico para injetar ímpeto na cooperação de alta qualidade da BRI. (Belt and road Initiative.)

    A China através da BRI, vai aprofundar nessa cimeira com os países da Ásia Central, novos acordos e medidas de implantação da Nova Rota da Seda.

    Xi fará um discurso de abertura na cúpula, expondo a posição da China sobre como construir a comunidade China-Ásia Central com um futuro compartilhado, visando o desenvolvimento de longo prazo para a cooperação entre os seis países, apresentando uma série de proposições e anunciando múltiplas medidas e ações pragmáticas.

    A BRI compreende um Cinturão Econômico da Rota da Seda – uma passagem transcontinental que liga a China ao sudeste da Ásia, sul da Ásia, Ásia Central, Rússia e Europa por terra – e uma Rota da Seda Marítima do século XXI, uma rota marítima que conecta as regiões costeiras da China com sudeste e sul da Ásia, Pacífico Sul, Oriente Médio e África Oriental, até a Europa.


    Participam dessa cúpula: Cazaquistão, Quirguistão, Tadjiquistão, Turcomenistão e Uzbequistão

     

    A iniciativa define cinco grandes prioridades:

     

    coordenação de políticas;

    conectividade de infraestrutura;

    comércio desimpedido;

    integração financeira;

    e conectando pessoas.

    Detalhe: E nenhuma bala, nem armamento algum.

    Leia mais 

domingo, 14 de maio de 2023

A EUROPA PODE SOBREVIVER A ESTE MOMENTO?

 

Um novo fantasma está pairando sobre a Europa - a guerra. O continente mais violento do mundo em termos de número de mortes causadas por guerras nos últimos 100 anos (para não recuar mais e incluir as mortes sofridas pela Europa durante as guerras religiosas e as mortes infligidas pelos europeus aos povos submetidos ao colonialismo) caminha para uma nova guerra.

Quase 80 anos depois da Segunda Guerra Mundial, o conflito mais violento até agora, que matou entre 70 e 85 milhões de pessoas, a guerra que está a caminho pode ser ainda mais mortal. Todos os conflitos anteriores começaram aparentemente sem um motivo forte e deveriam durar pouco tempo. No início desses conflitos, a maioria da população abastada seguia sua vida normal – compras e teatro, leitura de jornais, férias e conversas ociosas sobre política.


 Sempre que surgia um conflito violento localizado, prevalecia a crença de que seria resolvido localmente. Por exemplo, muito poucas pessoas (incluindo políticos) pensaram que a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), que levou à morte de mais de 500.000 pessoas, seria o prenúncio de uma guerra mais ampla – a Segunda Guerra Mundial – mesmo que as condições no chão apontaram para isso. Sabendo que a história não se repete, é legítimo perguntar se a atual guerra entre a Rússia e a Ucrânia não é o prenúncio de uma nova guerra muito mais ampla.

 

Acumulam-se os sinais de que um perigo maior pode estar no horizonte. Ao nível da opinião pública e do discurso político dominante, a presença deste perigo manifesta-se em dois sintomas opostos. Por um lado, as forças políticas conservadoras não apenas controlam as iniciativas ideológicas, mas também gozam de uma recepção privilegiada na mídia. São inimigos polarizadores da complexidade e da argumentação serena, que usam palavras extremamente agressivas e fazem apelos inflamados ao ódio.

 Estas forças políticas conservadoras não se incomodam com a duplicidade com que comentam os conflitos e a morte (por exemplo, entre as mortes resultantes dos conflitos na Ucrânia e na Palestina), nem com a hipocrisia de apelar para valores que negam pela sua prática (eles expõem a corrupção de seus oponentes para esconder a sua própria).

 Nessa corrente de opinião conservadora, cada vez mais posições de direita e de extrema-direita se misturam, e o maior dinamismo (agressividade tolerada) vem destas últimas. Este dispositivo visa inculcar a ideia da necessidade de eliminar o inimigo. A eliminação por palavras leva a uma predisposição da opinião pública para a eliminação por atos.

 

Embora numa democracia não existam inimigos internos, apenas adversários, a lógica da guerra é insidiosamente transposta para assumir a presença de inimigos internos, cujas vozes devem primeiro ser silenciadas. Nos parlamentos, as forças conservadoras dominam a iniciativa política; enquanto as forças de esquerda, desorientadas ou perdidas em labirintos ideológicos ou cálculos eleitorais incompreensíveis, revertem a uma defesa tão paralisante quanto incompreensível. Como na década de 1930, a apologia do fascismo é feita em nome da democracia; a apologia da guerra é feita em nome da paz.

 Mas essa atmosfera político-ideológica é sinalizada por um sintoma oposto. Os observadores ou comentaristas mais atentos estão cientes do fantasma que assombra a Europa e surpreendentemente convergiram ao expressar suas preocupações sobre o assunto. Nos últimos tempos, tenho me identificado com análises de comentaristas que sempre reconheci como pertencentes a uma família política diferente da minha: comentaristas conservadores, de direita moderada. O que temos em comum é a distinção que fazemos entre as questões da guerra e da paz e as questões da democracia. Podemos divergir no primeiro e convergir no segundo. Todos concordamos que só o reforço da democracia na Europa pode conduzir à contenção do conflito entre a Rússia e a Ucrânia e, idealmente, conduzir à sua solução pacífica. Sem uma democracia vigorosa,

 


Há tempo para evitar a catástrofe? Eu gostaria de dizer que sim, mas não posso. Os sinais são muito preocupantes. Primeiro, a extrema direita está crescendo globalmente, impulsionada e financiada pelas mesmas partes interessadas que se reúnem em Davos para cuidar de seus negócios. Na década de 1930, tinham muito mais medo do comunismo do que do fascismo, hoje, sem a ameaça comunista, temem a revolta das massas empobrecidas e propõem como única resposta a violenta repressão policial e militar. Sua voz parlamentar é a da extrema direita. Guerra interna e guerra externa são as duas faces do mesmo monstro, e a indústria de armas ganha igualmente com ambas as guerras.

 Em segundo lugar, a guerra na Ucrânia parece mais confinada do que na realidade é. O atual flagelo, que assola o continente, onde há 80 anos morreram tantos milhares de inocentes (a maioria deles judeus), assemelha-se muito à autoflagelação. A Rússia até aos Urais é tão europeia como a Ucrânia, e com esta guerra ilegal, para além da perda de vidas inocentes, muitas das quais serão pessoas de língua russa, a Rússia está a destruir as infra-estruturas que ela própria construiu sob a ex-União Soviética.

 A história e as identidades étnico-culturais entre a Rússia e a Ucrânia estão muito mais entrelaçadas do que com outros países que outrora ocuparam a Ucrânia e agora a apoiam. A Ucrânia e a Rússia precisam garantir uma maior ênfase em seus processos democráticos para acabar com a guerra e garantir a paz.

 

A Europa é muito maior do que os olhos de Bruxelas podem alcançar. Na sede da Comissão Europeia (ou sede da OTAN, que dá no mesmo), domina a lógica da paz segundo o Tratado de Versalhes de 1919, e não a estabelecida no Congresso de Viena de 1815. A primeira humilhou a potência derrotada (Alemanha) após a Primeira Guerra Mundial, e a humilhação levou a uma nova guerra 20 anos depois; este honrou a potência derrotada (a França napoleônica) e garantiu um século de paz na Europa.

 

A paz que hoje se propõe é a do Tratado de Versalhes. Pressupõe a derrota total da Rússia, tal como Adolf Hitler a imaginou quando invadiu a União Soviética em 1941. Mesmo admitindo que isto ocorra ao nível da guerra convencional, é fácil prever que se a potência perdedora tiver armas nucleares, não hesitará em usá-los. Haverá um holocausto nuclear. Os neoconservadores americanos já incluem essa eventualidade em seus cálculos, convencidos em sua cegueira de que tudo ocorrerá a milhares de quilômetros de suas fronteiras. América primeiro... e por último. É bem possível que já estejam pensando em um novo Plano Marshall, desta vez para armazenar o lixo atômico acumulado nas ruínas da Europa.

 Sem a Rússia, a Europa é metade de si mesma, econômica e culturalmente. A maior ilusão inculcada nos europeus pela guerra de informação do ano passado é que a Europa, uma vez amputada da Rússia, poderá recuperar sua integridade com a ajuda dos EUA, que cuidam muito bem de seus interesses. A história mostra que um império em declínio sempre tenta arrastar suas zonas de influência para retardar o declínio. Se ao menos a Europa soubesse cuidar de seus próprios interesses.

Boaventura de Sousa Santos é professor emérito de sociologia na Universidade de Coimbra, em Portugal. Seu livro mais recente é  Decolonizing the University: The Challenge of Deep Cognitive Justice .

Publicado originalmente no globetrotter

QUAIS OS OBJETIVOS DO IMPÉRIO?

 

 O Ocidente não pode renunciar ao sentido de si mesmo no centro do Universo, embora não mais no sentido racial, 

Por: Alastair Crooke.

 Um objetivo estratégico exigiria um propósito unitário que pudesse ser delineado sucintamente. Além disso, exigiria uma clareza convincente sobre os meios pelos quais o objetivo seria alcançado e uma visão coerente sobre como seria realmente um resultado bem-sucedido.

 Winston Churchill descreveu o objetivo da Segunda Guerra Mundial como a destruição da Alemanha. Mas isso era 'platitude' e nenhuma estratégia. Por que a Alemanha seria destruída? Que interesse teve a destruição de um parceiro comercial tão importante? Foi para salvar o sistema comercial imperial? Este último faliu (depois de 'Suez') e a Alemanha entrou em profunda recessão. Então, qual era o resultado final pretendido? A certa altura, uma Alemanha completamente desindustrializada e pastoralizada foi postulada como o (improvável) fim do jogo.

 Churchill optou pela retórica e pela ambiguidade.

 O mundo de língua inglesa hoje é mais claro sobre seus objetivos estratégicos com a guerra contra a Rússia do que naquela época? Sua estratégia é realmente destruir e desmembrar a Rússia? Em caso afirmativo, com que finalidade precisa (como 'o salto' para a guerra contra a China?). E como a destruição da Rússia – uma grande potência terrestre – será realizada por estados cujas forças são principalmente o poder naval e aéreo? E o que se seguiria? Uma Torre de Babel de estados asiáticos conflitantes?

 A destruição da Alemanha (uma antiga potência cultural dominante) foi um floreio retórico de Churchill (bom para o moral), mas não uma estratégia. No final, foi a Rússia que fez a intervenção decisiva na Segunda Guerra. E a Grã-Bretanha terminou a guerra financeiramente falida (com enormes dívidas) – uma dependência e refém de Washington.

 Naquela época, como agora, havia objetivos confusos e conflitantes: desde a era da guerra dos Bôeres, o establishment britânico temia perder sua "jóia da coroa" do comércio dos recursos naturais do Oriente para a putativa ambição da Alemanha de se tornar um comerciante 'Império'.

 Em suma, o objetivo da Grã-Bretanha era a manutenção da hegemonia sobre as matérias-primas derivadas do Império (um terço do globo), que então travavam a primazia econômica da Grã-Bretanha. Esta foi a consideração primordial dentro daquele círculo interno de pensadores do Establishment – ​​juntamente com a intenção de alistar os EUA no conflito.

 

Hoje vivemos um narcisismo que eclipsou o pensamento estratégico: o Ocidente não pode renunciar ao sentido de si mesmo no centro do Universo (embora não mais no sentido racial, mas através de sua substituição por políticas de vítimas que exigem infinitas reparações, como sua reivindicação de primado moral).

 No entanto, no fundo, o objetivo estratégico da atual guerra liderada pelos EUA contra a Rússia é manter a hegemonia do dólar americano – atingindo assim uma nota ressonante com a luta da Grã-Bretanha para manter sua lucrativa primazia sobre muitos dos recursos mundiais, tanto quanto para explodir a Rússia como um concorrente político. A questão é que esses dois objetivos não se sobrepõem – mas podem seguir direções diferentes.

 Churchill também perseguiu duas 'aspirações' bastante divergentes – e, em retrospecto, não alcançou nenhuma. A guerra com a Alemanha não consolidou o domínio da Grã-Bretanha sobre os recursos globais; em vez disso, com a Europa continental em ruínas, Londres se abriu para que os EUA destruíssem e, em seguida, assumissem para si seu antigo império, como principal consequência de o Reino Unido se tornar um empobrecido devedor de guerra.

 Aqui hoje, estamos no ponto de inflexão (a menos de uma guerra nuclear, que nenhuma das partes deseja), que a Ucrânia não pode 'vencer'. Na melhor das hipóteses, Kiev pode montar operações periódicas de sabotagem do tipo forças especiais dentro da Rússia que têm um impacto desproporcional na mídia. No entanto, essas ações esporádicas não alteram o equilíbrio militar estratégico que agora é esmagadoramente pendendo para a vantagem da Rússia.

 Como tal, a Rússia imporá os termos da derrota ucraniana – o que quer que isso signifique em termos de geografia e estrutura política. Não há nada para discutir com os 'colegas' ocidentais. Essa 'ponte' foi queimada quando Angel Merkel e François Hollande admitiram que a estratégia ocidental da 'revolução' de Maidan em diante – e incluindo os Acordos de Minsk – era uma simulação para mascarar os preparativos da OTAN para uma guerra por procuração contra a Rússia.

 

Agora que esse subterfúgio está aberto, o Ocidente tem sua guerra por procuração liderada pela OTAN; mas as sequelas desses enganos são que o Coletivo Putin e o povo russo agora entendem que um fim negociado para o conflito está fora de questão: Minsk agora é 'águas passadas'. E como o Ocidente se recusa a entender a essência da Ucrânia como uma guerra civil latente que eles deliberadamente iniciaram por meio de sua ávida defesa do nacionalismo anti-russo "ultrapassado", a Ucrânia agora representa um gênio que há muito escapou de sua garrafa.

 Como o Ocidente brinca com uma guerra por procuração "para sempre" contra a Rússia, não tem nenhuma vantagem estratégica clara para montar tal curso de atrito. A base de armas industrial militar ocidental está esgotada. E a Ucrânia teve uma hemorragia de homens, armamentos, infraestrutura e recursos financeiros.

 Sim, a OTAN pode montar uma força expedicionária da OTAN – uma 'coalizão de voluntários' no oeste da Ucrânia. Essa força pode se sair bem (ou não), mas não prevalecerá. Qual seria, portanto, o ponto? O 'humpty dumpty' ucraniano já caiu de sua parede e está em pedaços.

 

Por seu controle total
das plataformas de mídia e tecnologia, o Ocidente pode impedir que suas populações saibam até que ponto o poder e as pretensões ocidentais foram perfurados por mais algum tempo. Mas para quê? A dinâmica global resultante – os fatos da esfera da batalha – acabará por 'falar' mais alto.

 

Então, Washington começará a preparar o público? (ou seja, a fraqueza ocidental de John Bolton ainda poderia permitir que Putin arrebatasse a vitória das garras da derrota ) repetindo a narrativa neocon sobre o Vietnã: 'Teríamos vencido se o Ocidente tivesse mostrado a força de sua determinação'. E então rapidamente 'seguir em frente' da Ucrânia, deixando a história desaparecer? Talvez.

 

Mas a destruição da Rússia sempre foi o principal objetivo estratégico dos EUA? O objetivo não é – ao contrário – garantir a sobrevivência das estruturas financeiras e militares associadas, tanto americanas quanto internacionais, que permitem enormes lucros e a transferência de economias globais para os “Borg” de segurança ocidental? Ou, simplesmente, a preservação do domínio da hegemonia financeira dos EUA.

 

Como escreve Oleg Nesterenko, “essa sobrevivência é simplesmente impossível sem a dominação mundial militar-econômica ou, mais precisamente, militar-financeira. O conceito de sobrevivência às custas da dominação mundial foi claramente articulado no final da Guerra Fria por Paul Wolfowitz, o Subsecretário de Defesa dos Estados Unidos, em sua chamada Doutrina Wolfowitz, que via os Estados Unidos como a única superpotência remanescente no o mundo e cujo principal objetivo era manter esse status: “impedir o reaparecimento de um novo rival, seja na ex-União Soviética ou em qualquer outro lugar, que seja uma ameaça à ordem anteriormente representada pela União Soviética””.

 

O ponto aqui é que, embora a lógica da situação pareça exigir um pivô dos EUA de uma guerra invencível na Ucrânia para um 'movimento' para outra 'ameaça', na prática o cálculo é provavelmente mais complicado.

 

O célebre estrategista militar Clausewitz fez uma clara distinção entre o que hoje chamamos de 'guerras de escolha' e o que este último denominou 'guerras de decisão' – sendo estas últimos conflitos existenciais, por sua definição.

 

A guerra na Ucrânia geralmente é considerada como pertencente à primeira categoria de 'uma guerra de escolha'. Mas isso está certo? Os eventos se desenrolaram longe do esperado na Casa Branca. A economia russa não entrou em colapso – como presunçosamente previsto. O apoio do presidente Putin é alto em 81%; e a Rússia coletiva se consolidou em torno dos objetivos estratégicos mais amplos da Rússia. Além disso, a Rússia não está isolada globalmente.

 

Essencialmente, a Equipe Biden pode ter se entregado a um pensamento preconceituoso – projetando na Rússia muito diferente e culturalmente ortodoxa de hoje, opiniões que eles formaram durante a era anterior da União Soviética.

 


Pode ser que o cálculo da equipe Biden tenha mudado com a compreensão crescente desses resultados imprevistos. E especialmente, a exposição do desafio militar americano e da OTAN como sendo inferior à sua reputação?

 

Esse foi um medo que Biden realmente expôs em sua reunião na Casa Branca durante a visita de Zelensky antes do Natal. A OTAN sobreviveria a tal franqueza? A UE permaneceria intacta? Considerações graves. Biden disse que passou centenas de horas conversando com líderes da UE para mitigar esses riscos.

 

Mais precisamente, os mercados ocidentais sobreviveriam a tal franqueza? O que acontece se a Rússia, durante os meses de inverno, levar a Ucrânia à beira do colapso do sistema? Biden e sua administração fortemente anti-russa simplesmente levantarão as mãos e concederão a vitória à Rússia? Com base em sua retórica maximalista e compromisso com a vitória ucraniana, isso parece improvável.

 

O ponto aqui é que os mercados permanecem altamente voláteis enquanto o Ocidente está à beira de uma contração recessiva que o FMI alertou que provavelmente causará danos fundamentais à economia global. Ou seja, a economia americana vive no momento mais delicado – à beira de um possível abismo financeiro.

 

Não poderia Biden 'tornar explícito' que as sanções contra a Rússia provavelmente não serão revertidas; que a interrupção da linha de abastecimento persistirá; e que a inflação e as taxas de juros vão subir, são suficientes para empurrar os mercados 'além do limite'?

 


Estas são incógnitas. Mas a ansiedade toca na 'sobrevivência' dos EUA – isto é, a sobrevivência da hegemonia do dólar. Como a guerra da Grã-Bretanha contra a Alemanha não reafirmou ou restaurou o sistema colonial (muito pelo contrário) – também a guerra da Rússia da Equipe Biden falhou em reafirmar o apoio à ordem global liderada pelos EUA. Pelo contrário, desencadeou uma onda de desafio à ordem global.

 

A metamorfose no sentimento global arrisca o início de uma espiral viciosa: “O afrouxamento do sistema de petrodólares pode causar um golpe significativo no mercado de títulos do Tesouro dos EUA. A queda da demanda pelo dólar no cenário internacional acarretará automaticamente uma desvalorização da moeda; e, de fato, uma queda na demanda por títulos do tesouro de Washington. E isso por si só levará – mecanicamente – a um aumento das taxas de juros.

 

Em águas tão agitadas, o Team Biden não pode preferir impedir que o público ocidental aprenda o estado incerto das coisas, continuando a narrativa 'a Ucrânia está ganhando'? Um dos objetivos principais sempre foi o de controlar a inflação e as expectativas das taxas de juros – mantendo a esperança de um colapso em Moscou. Um colapso que devolveria a esfera ocidental ao 'normal' de energia russa abundante e barata e matérias-primas abundantes e baratas.

 Os EUA têm um controle extraordinário da mídia ocidental e das plataformas sociais. Os funcionários da Casa Branca podem estar esperando manter um dedo tampando a rachadura no dique, segurando o dilúvio, na esperança de que a inflação possa de alguma forma moderar (através de algum Deus ex Machina indefinido) - e que a América seja poupada do aviso de Jamie Dimon em Nova York em junho passado, quando mudou sua descrição da perspectiva econômica, de tempestade para força de furacão?

 Tentar ambos os objetivos de uma Rússia enfraquecida e manter intacta a hegemonia global do dólar, no entanto, pode não ser possível. Corre o risco de não alcançar nenhum dos dois - como a Grã-Bretanha descobriu na sequência da Segunda Guerra Mundial. Em vez disso, a Grã-Bretanha se viu "arruinada".

Publicação original , strategic.cultute.org 

BRASIL: DUAS CRISES E SEUS DILEMAS

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